15/12/2010

Discussão sobre a legalização das drogas

Abaixo, posicionamento de Lucas em relação à legalização das drogas. Ao fim, minhas ponderações.




Cara Fabiana, compartilho de todas as suas questões e preocupações com relação à legalização das drogas.

Eu sou a favor da legalização das drogas, entretanto, não sou a favor da simples legalização, na linha do "agora pode tudo".

O usuário de drogas deve ser tratado pelo sistema de saúde, e não com a criminalização. Afinal, o usuário é uma vítima.

O preço que pagamos pela manutenção da política proibicionista das drogas é o mais caro de todos: a perda de vida de milhares de jovens pobres, que ou são mortos em conflitos com a polícia (ou até o Exército, como ocorre no Rio) ou vão para o nosso internacionalmente famoso sistema carcerário, que aprisiona jovens, negros, pobres. O número de usuário presos é absurdo, beira quase a metade. E ali, como se sabe, é um pós-doutorado em criminologia, o jovem entra como um iniciante e sai já um profissional do crime, salvo raríssimas exceções.

O Estado deve assumir este problema e ter o controle sob as drogas, tanto para eliminar o mercado ilegal (narcotráfico) quanto para ter um acompanhamento sobre o usuário.

Como você bem sabe, o aumento do uso das drogas reflete as contradições do modo capitalista de existência humana. A questão não é banir as drogas, pois isto seria uma utopia gigante inclusive, além de empreitada totalitária, necessitaríamos de níveis de vigilância e polícia absurdas.

A questão é assumirmos este problema e que o Estado em conjunto com movimentos sociais e demais organizações tratem desta questão de forma humanista, para recuperarmos os usuários e acabarmos com o crime na prática, sem ter de tirar a vida ou prender cada traficante.

Indico-lhe o Coletivo Desentorpecendo A Razão, que é um coletivo nascido em São Paulo do qual simpatizo muito.


Um grande abraço e saudações libertárias,

Lucas


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Caro Lucas, agradeço, mais uma vez, o comentário.


A questão em destaque é bastante polêmica.

Concordo com você: o usuário deve ser tratado como uma vítima. Jamais como um criminoso.

Começo citando Mark Kleiman: "qualquer política de drogas que omita o "álcool" será como uma estratégia naval que omita o Oceano Atlântico e Pacífico".

O álcool é uma droga lícita que mata cada vez mais. Veja bem, o álcool é uma droga lícita e o consumo aumenta sensivelmente.

Em uma festa, o comum é pegar um copo de cerveja, de vodka e derivados, na expectativa de enchê-lo outra vez e novamente. Quem não bebe é o “careta”. Presenciei, inúmeras vezes, pessoas forçando o consumo apenas para participar “daquela rodinha”.

Percebo uma sociedade doente e tentei explicar o quanto o brasileiro não é preparado para certas “liberalidades”. A população é desinformada e modista.

Para mim, se a droga simplesmente for legalizada, o comum será cheirar, fumar e injetar. Porque, com o tempo, as drogas seriam vistas como o álcool é visto hoje. Seriam lícitas e, mesmo assim, matariam cada vez mais. Ou seja, quanto à legalização, sou a favor, primeiro, de um Estado mais ativo em relação à informação, à prevenção e ao cuidado aos dependentes.

Você pode perguntar: quem deixa de usar drogas apenas porque ela é ilegal? Coloco-me como exemplo. Desde pequena, sei que o álcool é lícito. Portanto, experimentei o álcool na adolescência. Não o via como uma droga. Já as drogas ilícitas, por serem ilegais, não experimentei. Se as vissem como o álcool, certamente experimentaria.

A abolição das leis teria um efeito maior nas pessoas que comumente não consomem drogas, levando um maior número a experimentar e a se tornar usuário regular ou esporádico.

Mas, é claro, não digo que a proibição acaba com o consumo e não foi o que eu quis mostrar.

A atuação do Estado em relação à prevenção do consumo de álcool é vexatória. O Estado não alerta adequadamente. Por que devo acreditar que em relação às outras drogas seria diferente? O Estado é falho. Não age. Não educa. Não informa. Antes de simplesmente legalizar as drogas, a população deve estar preparada. Portanto, exijo que o Estado faça o seu papel. Enquanto houver descaso em relação às drogas, recuso-me a acreditar que nós estamos preparados.

Se o Estado está interessado na diminuição da violência no Brasil, terá de observar que o controle social e político do álcool é muito mais importante do que as drogas ilícitas. Afinal, o álcool é uma das principais causas de violência no país.

Vejo muitas pessoas citarem a Holanda como grande exemplo nesta questão. Entendo que há uma grande idealização quanto aos resultados da mera legalização. Percebo, também, que comparar aquele país com o Brasil está muito além da realidade. Prefiro crer que a Suécia é o melhor exemplo a se seguir (política restritiva - NÃO REPRESSIVA - que dá o mesmo valor ao controle, prevenção e tratamento) .

O Estado não se torna totalitário apenas por proibir alguma coisa. Ele dita as regras, com o intuito do bem-estar social. O raciocínio de que qualquer atuação do Estado no sentido de proibir é uma afronta à liberdade, é equivocado. Queimam-se os códigos, as leis e tudo quanto é regra, portanto. Quanto ao assunto, sou a favor da restrição.

Acreditar que o Estado controlaria o consumo de drogas, para mim, é utopia. Que assumiria o problema: utopia. Acreditar em uma visão humanista do governo, neste cenário, outra utopia.

O caminho seria promover a prevenção e o tratamento, baseados em evidências e não em ideologia.

O número de pessoas presas devido às drogas é a imagem da incapacidade do governo em relação à prevenção. Como você disse, o preço que pagamos pela política proibicionista das drogas é muito caro . Porém, essa análise de custo/benefício ignora vários fatores. Por exemplo, subestima o custo da dependência para os indivíduos e suas famílias.

A corrupção faz o tráfico existir. Não a ilegalidade das drogas. Enquanto não enxergarmos que devemos exigir uma mudança neste sistema corrupto, que pensa apenas no lucro e não no indivíduo, persistiremos no erro. Falar somente em legalizar as drogas nada mais é do que ser complacente com a deliberada incompetência do governo. Primeiro devemos exigir um Estado atuante.

Acreditar na diminuição da violência, no Brasil, devido à mera legalização das drogas, também, para mim, é utopia. Não existiriam mais os traficantes de drogas (em tese), mas o número de seqüestradores, ladrões e afins, aumentaria. As drogas ainda motivariam a violência, pois, um dos fatores que gera enorme selvageria, é a compra de drogas. Os dependentes ainda teriam que comprá-las. Continuariam, portanto, a roubar, furtar e a matar para obter a droga. Jovens, negros e pobres ainda seriam alvos.

Os traficantes, em sua maioria, não são marginais porque a droga é ilegal. Se a opção traficante não estiver mais disponível, buscarão outro caminho – na criminalidade. Eles e a violência são frutos desta sociedade movida pela ditadura do capital, ou seja, pela desigualdade.


Obrigada por engrandecer a discussão.


Fabiana.

14/12/2010

A legalização das drogas: estamos preparados?

Tráfico de drogas.

Violência.

O ideal seria, simplesmente, legalizar as drogas?

Nossa sociedade é movida a interesses privados. Por que o álcool, um produto nocivo, é cada vez mais consumido pela população?

Advertências, nas propagandas, de que álcool faz mal, em nada adiantam.

Nossa sociedade é movida a “modinhas”. Para os jovens, é “cool” “beber todas”. A bebida não é vista como uma droga. Mas mata. Cada vez mais. E é um caso de saúde pública, segundo a Organização Mundial de Saúde.

A prevenção em relação ao consumo de drogas seria tão inútil quanto é em relação ao consumo de álcool.

A irresponsabilidade do jovem brasileiro em relação ao álcool é evidente.

Se, hoje, o álcool, que é uma droga e mata, é visto com descaso por muitos e é consumido cada vez mais, como seriam, no futuro, as drogas, se elas fossem legalizadas?

As festas seriam “open drugs”?


Podemos desprezar o mal que as drogas fazem?

Será que os dependentes concordariam? Aqueles milhares, que freqüentam clínicas? Que vivem o sofrimento e que sobrevivem a cada dia?

Será que as famílias dos dependentes concordariam? Aquelas que frequentam clínicas? Que vivem, presenciam o sofrimento e que sobrevivem a cada dia?

O nível de informação passada para os jovens é precário.

O Brasil ainda não está preparado para uma eventual legalização.

Antes, o Estado precisa agir, prevenir e, principalmente, educar.

06/12/2010

Formaturas...

Ainda me lembro da primeira formatura. Lembranças turvas de faces agitadas. Colegas pequeninos, como eu, enfileirados à espera da inédita Foto de Formatura. No corredor, paredes de tijolinhos alaranjados quase não conseguiam conter tanto movimento e excitação. Crianças hiperativas - quase um pleonasmo - com suas mentes voltadas à tão esperada foto.

Ao chegar à sala da Foto de Formatura, um rapaz moreno entregou-me um colete vermelho. Percebi uma textura aveludada enquanto o vestia. Um chapéu, também vermelho, foi colocado delicadamente em minha cabeça. Um canudo foi-me entregue. Sentei-me no pequeno banco. Bochechas rosadas, frutos da companheira timidez, combinavam perfeitamente com o ambiente avermelhado. Olhei a luz forte que iluminava toda a sala. Escutei: “Não sorria”. Não sorri. A foto, então, foi tirada.

Nosso maior anseio era a foto. As expectativas eram momentâneas. Vivíamos o presente. Futuro? Era aguardado com descuido.

Anos depois, uma nova formatura. O futuro, renegado no passado, foi adicionado ao meu vocabulário. O perfil da criança descrita não se alterou. A expectativa conserva-se. O movimento e a excitação da criança permanecem e acalentam a espera pelo futuro. A foto é aguardada, mas agora não é a única preocupação. Modificaram-se os objetivos e as responsabilidades.

Porém, devaneios juvenis tornam-se presentes, uma vez que somos frutos verdes em raízes adubadas. A inexperiência captada na foto tirada há dezoito anos retorna de uma forma consciente e pretensiosa.

O futuro é elaborado aos poucos. Meu alicerce, em fase de desenvolvimento, me propicia uma maior visão dos meus desejos. Alguns ainda ocultos, mas que se ilustrarão com o passar das formaturas...